30/09/25

Aumentar a escala de produção em agroflorestas é uma das soluções baseadas na natureza urgentes para a mitigação das emissões no uso da terra  

A transição para modelos agrícolas mais sustentáveis ganha força nas mãos de quem vive o dia a dia no campo. Adenilson de Almeida Vieira, 28 anos, natural de Serra Grande (BA), atua há dois anos em um Sistema Agroflorestal (SAF) na Fazenda Sucupira, por meio da Courageous Land — startup apoiada pelo Fundo Vale.  Antes de se juntar à agrofloresta, Adenilson trabalhava em lavouras de banana e cacau, onde o uso intenso de agrotóxicos era parte da rotina e os resíduos naturais do campo eram simplesmente descartados. 

Hoje, imerso em práticas agroflorestais voltadas para a recuperação ambiental, Adenilson fala com familiaridade de adubação verde e biomassa, refletindo o orgulho de ver a terra se transformar. “Muita área aqui era seca, castigada. A gente desbastou, colocou biomassa no chão, e agora a terra tá rica, mudou. Ganhou nova vida”, relata.  

Darwin Daniel Cordero Monge, 37 anos, trocou o trabalho em plantações de café e cacau na Venezuela por uma nova vida dedicada à agricultura regenerativa em Roraima. Desde que ingressou na Fazenda Alegria, da Courageous Land, ele é supervisor de viveiro, orientando colegas no manejo das mudas e das espécies nativas, além de aplicar o que aprende diariamente no contato com novas culturas, como açaí e mogno. Para Darwin, a experiência, além do crescimento profissional, é um legado de conhecimento para sua família. 

 “Ver que estamos reflorestando, tentando mudar o solo, o clima, e modificar muitas coisas que estão acontecendo, como a mudança climática. A Courageous Land trabalha justamente nisso, tentando combater essas mudanças”, afirma. Diante dos desafios do desmatamento e de uma tradição histórica de pecuária extensiva, Darwin acredita que o aprendizado contínuo e a dedicação à agrofloresta podem abrir caminhos para um futuro mais sustentável. 

Mitigação climática  

Segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), soluções baseadas na natureza  (entre elas os SAFs) podem contribuir com até 37% da redução de emissões necessárias para limitar o aquecimento global até 2030. Estudos recentes da Universidade de Oxford mostram que áreas de agrofloresta com espécies nativas conseguem capturar até 12 toneladas de CO₂ por hectare, anualmente. 

“Na escala da fazenda, as agroflorestas representam maior segurança econômica e maior resiliência ecológica e climática. Em escala planetária, as agroflorestas podem atuar como um combo de soluções integradas para combate às mudanças climáticas e para o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável”, pontua Gilberto Terra, co-fundador da Courageous Land. 

Além de aumentar o sequestro de carbono, os SAFs conservam até 80% mais biodiversidade que cultivos convencionais (IPBES, 2023), melhoram em até 90% o controle da erosão e aumentam em 50% a infiltração da água no solo (Nature, 2024). Também trazem resultados financeiros atrativos:  segundo levantamento da Courageous Land, créditos de carbono ligados a SAFs podem render até US$ 500 por hectare ao ano.  

O desafio da escala 

Apesar dos resultados positivos e do reconhecimento científico, os SAFs ainda enfrentam baixa adoção global. Atualmente, ocupam menos de 1% das terras agrícolas do planeta (World Bank, 2024). No Brasil, o cenário é semelhante: apenas 0,3% dos estabelecimentos rurais utilizam sistemas agroflorestais integrados, de acordo com o IBGE (2023). O Plano ABC+ já estabelece a meta de 5 milhões de hectares com agroflorestas até 2030, mas a execução ainda esbarra na falta de coordenação entre políticas públicas, financiamento e suporte técnico. 

Com o objetivo de oferecer diagnóstico gratuito sobre o potencial agroflorestal, climático e econômico de qualquer terra no Brasil, a Courageous Land atua com uma plataforma de inteligência agroclimática desenvolvida com apoio do Fundo Vale. A ferramenta une tecnologia, consultoria técnica e estruturação financeira para viabilizar agroflorestas em larga escala.  

“Expandir sistemas agroflorestais exige trabalho colaborativo entre organizações, empresas, financiadores e governos. O Fundo Vale investe em parcerias para destravar gargalos de financiamento e assistência técnica — e assim tornar a produção agrícola mais resiliente frente às mudanças do clima e um vetor de recuperação ambiental”, reforça Bia Marchiori, responsável pela frente técnica, do conhecimento e de salvaguardas socioambientais da Meta Florestal 2030 da Vale.  

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O debate na COP 30 

A COP 30 deverá evidenciar a agricultura regenerativa e os sistemas agroflorestais como caminhos para mitigação da crise climática. Garantir o acesso a recursos financeiros será essencial para levar os SAFs a escala continental, especialmente em territórios de alta vulnerabilidade social. A expectativa é que fundos climáticos, bancos de desenvolvimento e investidores privados avancem na criação de instrumentos mais acessíveis e adaptados às realidades dos produtores rurais. 

A regulamentação dos créditos de carbono também deve ganhar força. Com marcos mais claros sobre adicionalidade, rastreabilidade e integridade ambiental, projetos de base agroflorestal poderão acessar mercados mais seguros e valorizados.